quinta-feira, novembro 29, 2012

O Haiti não é aqui

Esta manhã encontro uma amiga pela rua abaixo. A conversa deixa rapidamente de ser de circunstância. Saca rapidamente de uma navalha indagatória para me questionar onde é que no mundo se pode viver. Eu não sei. Eu achava que se podia viver ali mesmo naquela rua. Eu ia apenas pela rua abaixo, ia trabalhar, não ia a pensar no mundo. Nem sequer ia trabalhar para ser feliz. Ia trabalhar para poder viver. Para poder ligar a televisão à noite e poder ser gozado pelo primeiro-ministro. Ia trabalhar, como quem corre para ganhar lanço para saltar o triplo salto, para poder passar por cima de 2013. Eu não sei essas coisas.

Mas é mais forte que nós. Quando nos perguntam uma coisa qualquer, temos que nos mostrar inteligentes. Temos que mostrar uma resposta que dê sentido ao mundo. Eu respondi: Brasil. Claro. Os americanos andam preocupados em colonizar Marte; os portugueses com a colonização do Brasil. Funcionou para todos antes de nós. Há-de funcionar para nós também. Espero.

Depois recebo na minha caixa do correio uma mensagem que diz: "Somos Menezes". Eu não sou Menezes. Na minha família ninguém é Menezes. Eu acho até que nunca dei o meu endereço de correio electrónico a nenhum Menezes. Aquilo deve ser spam (que é como o google se refere ao lixo que nos chega ao correio). Eu não sei. Mas, como sou débil, vou ler o que se trata.

Na Rússia, o presidente não pode ser presidente mais do que duas vezes consecutivas. Putin resolveu isso de forma elegante: foi acolá dar uma perninha como primeiro-ministro - o que pode ser visto como uma despromoção temporária - e depois voltou para ser presidente. As democracias não precisam destas manobras, aliás dispensam-nas bem.

Em Gaia, o presidente não pode ser presidente mais do que três vezes consecutivas. O Menezes resolveu isso de forma elegante. Vai ali ao Porto dar uma perninha como presidente. Neste caso deve ser visto como uma promoção. Gaia é maior, tem mais gente, melhores vistas, teleférico e até tem o El Corte Inglês. Mas o Porto é o símbolo; a medalha que melhor fica na lapela. Por cá a manobra vai passar como um exemplo. Estou certo que outros cidadãos o seguirão.

O email deve ter razão: Em Portugal somos todos Menezes. Vamos-nos safando com esquemas, saltando pocinhas e tornando a democracia criativa. Todos? Excepto essa minha amiga que anda a pensar exilar-se. Ou eu que tenho que trabalhar todos os dias, sem tempo para ser criativo na interpretação de leis.

Penso no Haiti. O Haiti não é aqui.

| tervuren | 2011 |

terça-feira, novembro 13, 2012

É que amanhã não há café.

Relembro-me do que escrevi a 14 de Setembro. Não tenho vontade de dizer mais nada sobre o assunto.

Apenas me resta acrescentar que uma greve geral deve ser também uma greve ao consumo. Que não seja facturado 1 cêntimo de IVA amanhã. Que não seja consumido um único café. Que não se compre um só bilhete de metro. Que não haja um único pão fresco em casa alguma.

Amanhã é dia de usar o congelador. E a cabeça. Não esquecer.


| 15 set | porto | setembro | 2012 |