domingo, janeiro 29, 2012

Passos Coelho e os seus três generais.

Sob pretexto de querer conhecer a vida pessoal e os interesses culturais dos generais de Junta Militar de Pinochet, o anti-fascista (e exilado) espanhol José Maria Berzosa conseguiu em 1976-77 realizar um documentário onde com imensa candura podemos observar o (pouco) que pensam algumas das maiores bestas que pisaram o planeta. Recordo-me de um dos seus generais tentar mostrar um falso interesse por música clássica e explicar que a literatura se revestia de demasiada densidade para os seus gostos simples: em particular Garcia Márquez era aos olhos do general um chato, não propriamente um subversivo.

Os chilenos eram torturados de todas as formas e esta é uma das formas que mais me marcou: eram governados por analfabetos. Pessoas para quem gerir um país se resume a ter pulso firme com a canalhada. Os mais altos quadros não sabem sequer ler. Condição necessária mas certamente não suficiente.

O Chile foi um laboratório, o primeiro do mundo, onde o americano Milton Friedman pôde dar asas às suas mais recalcadas fantasias. Apesar de os cidadãos chilenos serem torturados e mortos por serem agentes de potências estrangeiras, o facto de toda a política económica ser dirigida directamente a partir de Chicago, por um bando de catatuas que se limitavam a aplicar acriticamente teses de infundada credibilidade, foi coisa que não incomodou em nada Pinochet.

Sendo português como os outros, estaria disposto a todos os sacrifícios no presente, para que o futuro pudesse ser mais soalheiro. Mas ultimamente lembro-me demasiadas vezes deste documentário. E fico com a estranha impressão que isto que nos andam a fazer nos últimos tempos é coisa de gente muito parva. Tenho a impressão que a figura do "ministro catatua sul-americano" foi trocada pela figura do "ministro copy-paste europeu". A mediocridade, a incapacidade técnica e a banalidade são as mesmas. O pior é que Portugal é uma coisa ainda mais chata e complicada de perceber que um romance do Garcia Márquez. E duvido que haja um só ministro com capacidade para fazê-lo. E isto apenas e só por falta de tempo - estou certo.

Tenho apreciado a bandeira da república na lapela dos ministros copy-paste. Cheguei a fazer "assim" com a boca e a pensar que "sim" (com a cabeça); que a Maçonaria havia levado os mais altos valores republicanos ao coração dos mais significativos dirigentes da direita portuguesa. Mas vejo agora que não é nada disso. A bandeira na lapela deve ser um franchising da ideia de Portugal. É como levar um cartucho de pasteis de nata no bolso sempre que se sai para o estrangeiro. Não tem nada a ver com a República. A República, que tem agora cem anos, é tão chata como os "cem anos de solidão" e isso não merece sequer um feriado. Um pin na lapela dos ministros chega e sobra.

O pior não chega a ser "isto" ou "aquilo". O pior é a sensação que me fica (confirmada bem recentemente pelo senhor presidente) que quando quem nos dirige fica sem "copy" para fazer "paste" e começa a dizer exactamente aquilo que pensa ficamos a perceber que somos dirigidos por um comité de tortura para quem gerir um país é como gerir uma mercearia - mantendo o caderninho das contas bem apresentado e o chão varrido, não vá o fiscal aparecer sem se anunciar.

| 15-O | bruxelas | 15 de Outubro de 2011 |

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