segunda-feira, maio 12, 2008

Deveria ser possível dar chapada em certas pessoas, só porque sim.

Sempre achei divertida a ideia de que alguém poderia ser corrido da política da melhor maneira - após uma derrota improvável - para voltar passado uns anos como se nada tivesse acontecido. Foi esse o caso do Cavaco, que nas primeiras eleições presidenciais onde participou, foi humilhado por um candidato que sempre foi apresentado como derrotado à partida. Cavaco nunca tinha perdido umas eleições até aí. Nessa altura, até eu votei no Jorge Sampaio.

Em favor da eleição do Cavaco para a presidência jogou não só o comportamento deplorável do PS, como o início da decepção com a governação do Sócrates. Mas foi fundamental, como é evidente, a ausência absoluta de memória histórica por parte de grande parte da população, daquilo que foram os anos de selvajaria do cavaquismo. Uma falha também da esquerda no reavivar da memória desses tempos e do seu contributo para aquilo que o país é hoje.

Mais irónico é ouvir agora Cavaco falar da falta de memória dos jovens portugueses e do seu afastamento em relação à política. Ainda por cima falando do 25 de Abril. Vindo de alguém como o Cavaco, qualquer discurso sobre o 25 de Abril soa a bolo rei mal mastigado. Mas o que mais me choca é a falta de percepção daquilo que é a realidade jovem/juvenil do nosso país em pleno séc XXI.

Para compreender o que é determinante politicamente para alguém com menos de 35 anos, deve olhar-se mais depressa para os anos do cavaquismo e do guterrismo (pga, propinas, provas de aferição, provas globais, educação sexual, cargas policiais, os recibos verdes, as privatizações de serviços públicos, as cunhas, o caciquismo, o fandango do dinheiro europeu, etc...) do que para o 25 de Abril. Irónico.

E além disso, o discurso é terrivelmente paternal, conservador e irrelevante. E em vez de o desmontar dessa forma, toda a gente vai atrás dele procurando argumentos que mostram a vitalidade da juventude e como os jovens são exemplares. Neste país há pouca gente exemplar, sobretudo ao nível das elites. Mas de qualquer maneira por mais voltas que dê a Terra nunca Cavaco será capaz de perceber um jovem. Essa distância é uma saudável barreira higiénica.

Em 1934 quantos jovens saberiam quem foi o primeiro presidente da república? E hoje, quantos adultos o sabem? E já agora, isso é tão determinante para a compreensão da realidade social e política da juventude?

A política em Portugal não tem credibilidade. É em certa medida inconsequente. Ninguém tem culpa de nada, tudo vem já decidido algures de Bruxelas, o Estado parece uma comissão liquidatária dos serviços públicos. Mas olhando para a nossa história recente, que legitimidade tem Cavaco Silva para sugerir uma só medida que seja para melhorar a democracia?

Não há por aí um Bob Geldof que lhe atire isso à cara?



| atomium | bruxelas | abril de 2008 |

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